“Cara, descobri uma coisa hoje. Sabe como é o nome da mulher do Gilmar Mendes? Guiomar. G-U-I-O-M-A-R” E soltou uma gargalhada alta, típica dos Passareli e de toda boa família descendente de italianos.
Enquanto Fernando ria e contava algumas coisas, eu comia um pedaço de bolo e tomava um copo de leite na pequena cozinha que dividimos em Florianópolis. Nos conhecemos há cinco anos no Ensino Médio e no curso técnico de Automação Industrial do SENAI de Tubarão-SC. Desde então somos melhores amigos.
Ele está na terceira fase do curso de Física. Um jovem de 20 anos quase completos. Antes disso, cursou dois semestres de Ciências Sociais. Muita gente se pergunta: “Como assim? Mudou de Ciências Sociais pra Física? Que coisa nada a ver.”
Bom, quem o conhece bem sabe que essa mudança faz todo sentido: ele se dá bem tanto com leituras, resumos e seminários quanto com equações, integrais e derivadas. Eu fui para as letras, ele, para os números.
Todos os dias, às seis e meia da manhã. ele já está acordado. Faz seu café. Prepara um pão com doce de leite ou come algumas bolachas. Liga o computador e abre o Reddit. Ele não tem Facebook. Não mais. Ele decidiu excluir seu perfil, tanto pelo campo de guerra que a rede social se tornou quanto pelo tempo que poderia usar para estudar.
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| O físico Richard Feynman |
Nove de novembro de 2016. Seis e meia da manhã. Ele e eu saímos cada um de seu quarto. Eu tinha ficado acompanhando as eleições dos EUA durante a madrugada, ele foi dormir às dez e meia da noite anterior. Olhei pra ele com uma expressão irônica e debochada. Bastou isso pra ele pôr a mão na cabeça, me olhar com espanto e dizer “O Trump ganhou!”.“Isso mesmo, meu jovem”, eu respondi e dei uma risada.
Ele até gostava do primeiro semestre de Ciências Sociais. Mas o segundo...Só tinha visto o Fernando daquele jeito no curso técnico - que ele sabia que não usaria aquilo pra nada além de instalar umas tomadas no quarto. Ele não estava nem aí para o curso - nem para o técnico, nem para Ciências Sociais. Foi aí que ele começou a ler sobre Física e a velha paixão por ela começou a despertar.
Então ele leu “O senhor está brincando, sr. Feynman?”, autobiografia de Richard Feynman, um dos Físicos mais loucos e brilhantes. Ele me contava sobre o livro com entusiasmo, gesticulava e falava sobre o quanto o Feynman era louco. Até então, meados de outubro de 2015, ele só pensava mudar de curso.
Eu tinha certeza que ele mudaria. Afinal, entre a Ciência e a Sociedade, ele se dava melhor com a primeira. Um mês depois, pediu transferência. Chega de Marx, Weber ou Adam Smith. Newton, Pascal e tantos outros o esperavam no CFM - Centro de Ciências Físicas e Matemáticas. “Cara, esse pessoal de Sociais não bate bem da cabeça. Meu Deus do céu!”, sempre lembro dele falando isso.
Abri a porta de casa, que dá direto para o fogão, e lá estava ele falhando miseravelmente em fritar “orelhinhas”e protegendo seu rosto e cabelo dos respingos de óleo. “A massa ficou muito mole eu acho”, ele respondeu. Eu sugeri que ele não saísse do “campo da Focaccia”, sobre o qual ele tinha domínio. “Bora pedir uma pizza hoje?”, ele me perguntou. “Beleza!” respondi.
Na maior parte do tempo, Fernando está fazendo suas listas de exercícios - que são gigantescas. “Cara, a média das provas da nossa turma foi um desastre. Quatro. O cara ficou maluco com a gente.”. Ele, pelo menos, estava sempre bem acima da média da turma. Certamente ele será um excelente professor ou um Físico teórico.
Em um dos sábados em que os dois estariam em Tubarão, combinamos de ir ao cinema, assim dava pra ir com o resto do pessoal. Guardiões da Galáxia Vol.2. Não tinha como esse filme ser ruim. Nós dois concordamos nisso. Era sexta-feira, ele estava com uma camisa do Pink Floyd, nós dois estávamos muito animados pro filme e conversamos pra caramba sobre o futuro do Universo Cinematográfico da Marvel, sobre política, sobre outros filmes, sobre livros, sobre as aulas: nada que a gente não converse quase todo dia.
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